quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Comissão da Verdade nasce com a missão de apurar crimes da Ditadura


Por Shirley Marciano

“Era madrugada do dia 4 de novembro de 1969 e fazia apenas um mês que tinha dado a luz ao meu filho, quando fui surpreendida em casa para ser presa pelo delegado Sérgio Fleury. Foi um momento muito tenso. Ele queria levar meu recém-nascido para o juizado de menores. Mas, com a coragem de uma mãe protetora, eu falei: ‘Só vou se ele ficar com a minha família’. Então ele imediatamente disse: ‘Você sabe que posso usar de violência?’. Respondi: ‘Sei, mas eu não vou’”, conta Rose Nogueira.

Fleury foi embora, mas deixou dois policiais no local. “Eles estavam descontrolados e derrubando tudo que encontravam. Todos os papéis que consideravam suspeitos, perguntavam aos gritos o que era. Amarraram-me no sofá da sala e deixaram meu filho no quarto. Eu só podia ficar com ele para dar de mamar quando chorava.”
No dia seguinte, passaram para levá-la ao Departamento de Ordem Política e Social - Dops. No caminho, o seu bebê ficaria na casa de sua sogra.


Quando começou a se envolver com política, Rose tinha apenas 18 anos. Frequentava reuniões do Partido Comunista Brasileiro – PCB, mas não se considerava militante. “Eu namorava o jornalista Paulo Viana e por essa razão comecei a participar. Logo depois, o irmão dele passou a ser procurado pelos militares e acabou se exilando. Assim, vivenciei toda a angústia de sua família, o que reforçou minha ideologia de esquerda”, lembra.
Havia reuniões políticas na casa de Rose e era comum abrigar procurados por práticas consideradas subversivas, como Carlos Mariguella, Comandante da Ação Libertadora Nacional - ALN, assassinado pelos militares.

No Dops ficou presa junto com cerca de 50 outras mulheres. “Para ser torturada, eu tinha que ficar nua, e havia um policial tarado que falava que não gostava de ver o leite escorrendo do meu peito, então deram a mim uma injeção para cortar o leite”, conta emocionada.

Durante 3 meses, Rose ficou presa na mesma cela que a presidenta Dilma Rousseff, na chamada Torre das Donzelas. Explica que não era amiga íntima de dela, mas as impressões que tinha era a de ser muito estudiosa e bem humorada.

Após ficar 9 meses confinada, Rose Nogueira foi absolvida e libertada. Logo depois, foi trabalhar para a TV Cultura. “Tive como professor o Vlado (Vladimir Herzog) e nos tornamos muito amigos”. Quando ele morreu, em 1975, ela foi morar em Campinas-SP por receio de voltar as perseguições de outrora.

Depois entrou na Globo, onde foi editora do Jornal Nacional, e na TV Mulher (Globo), quando trabalhou com Henrique de Sousa Filho (Henfil) e Marília Gabriela.

A jornalista e escritora, Rose Nogueira, tem 66 anos, é presidente do grupo Tortura Nunca Mais - SP e é diretora do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo. Presidiu o Conselho de Defesa da Pessoa Humana - Condepe-SP e, na ocasião, publicou o livro Crimes de Maio. Ela considera que a Comissão da Verdade seja um grande avanço e acredita ser uma importante ferramenta para desvendar as mortes e as torturas.


Emiliano José, que também passou pelos ásperos tempos da luta contra a ditadura e que foi barbaramente torturado, conta que as situações que passou lhe exigiu muita força, disposição e consistência de ideais.
“A gente ia caminhando, atravessando atalhos perigosos, escapando aqui e ali, e depois caindo, sendo preso. E aí a inevitável tortura – o pau de arara, o choque elétrico, o afogamento, os espancamentos, violências inomináveis. E aí o teste, a situação-limite, quando você era confrontado com suas verdades mais íntimas, quando lhe era dado saber se os seus ideais políticos eram sólidos ou não. E depois da tortura, a longa noite de prisão, anos de confinamento, o sofrimento de apartar-se da vida.” Ele ficou preso por 4 anos.


O deputado federal Emiliano José é doutor em Comunicação e Cultura Contemporânea pela Universidade Federal da Bahia - UFBA, professor aposentado da Faculdade de Comunicação, jornalista e escritor. Para ele, a Comissão da Verdade já é por si só uma grande conquista do povo brasileiro.

O que é a Comissão da Verdade? 

A Lei 12.528/11, que institui a Comissão Nacional da Verdade - CNV, foi criada com o objetivo de esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações dos direitos humanos, como torturas, mortes e desaparecimentos, que aconteceram entre 1946 e 1988, além de recomendar medidas e políticas públicas para prevenir a violação desses direitos.
A comissão nomeada pela presidenta, em 11 de maio, é composta por 7 membros, que deverão preparar um relatório para ser entregue até 2014.


O Brasil é o 40° país a instaurar uma Comissão da Verdade no mundo e não tem caráter punitivo, mas tem a intenção de introduzir uma cultura para que não seja mais admitida uma situação como a que ocorreu nos anos de ditadura no Brasil.


Estado Brasileiro pede perdão a funcionários da Embraer perseguidos pela Ditadura Militar 
No último dia 24, em São José dos Campos, o Estado brasileiro pediu perdão aos 125 ex-funcionários da Embraer, anistiados pelo Ministério da Justiça, após as greves de 83, 84 e 88, quando foram demitidos e perseguidos pela Ditadura Militar.

A portaria, publicada no Diário Oficial da União, que reconhece o direito de anistiados, foi simbolicamente entregue pela vice-presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Suely Bellato.

A decisão de reconhecer e conceder reparação econômica aos militantes e ativistas que foram perseguidos durante a ditadura foi baseada na Lei de Anistia n º 10.559/2002. Muitos trabalhadores nesse período foram perseguidos e demitidos das empresas onde trabalhavam e, portanto, amargaram desemprego durante anos.
Os trabalhadores receberam uma pensão vitalícia, com valor médio de R$ 2 mil por mês. Também terão direito a uma indenização referente ao período retroativo. Os pagamentos começaram a ser
feitos em agosto.

(Para SindCT,18)

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